Década de 50. A vida era menos agitada. A juventude da metrópole se dividia entre idealistas políticos da classe média, a alta sociedade paulistana, e os migrantes nordestinos, recém-chegados em São Paulo em busca de trabalho e uma nova vida na cidade grande.
Adair, uma bela mulher alagoana de pele alva, cabelos castanhos sempre bem arrumados. Solteira e com apenas vinte e dois anos, vem do nordeste do Brasil para a cidade de São Paulo, sonhando uma nova vida, novos rumos, novas oportunidades. Acordava todos os dias às 4h da manhã, dependendo de tantos ônibus, trens e metrôs que não podíamos enumerar. Apesar de tudo isso, estava muito realizada e feliz!
Década de 60. Em meio aos funcionários de uma indústrias têxtil, Adair ainda atraía olhares e era cobiçada pelos rapazes, mesmo com suas quarenta primaveras completadas. Tinha o respeito, admiração e confiança de seus patrões e colegas de trabalho. Era ela quem abria e fechava a fábrica!
Sua vida pessoal, porém, consistia de breves romances, sem propósito. Com o passar do tempo, ainda conservava em seu coração o desejo de se casar, apesar da sensação de já ter passado da idade para isso.
Década de 70. Brasil imerso na ditadura militar. Para os trabalhadores menos abastados a vida significava a rotina costumeira da casa para o trabalho e se alegrar com o sucesso da seleção brasileira na Copa do Mundo – Desempenho que trouxe a taça de ouro do Tri Campeonato.
Numa dessas comemorações Adair conhece um jovem atraente de pele morena, por quem se apaixona. Ela, já com seus 46 anos, e o jovem rapaz com 30, não tinham tempo a perder: em poucos meses se casaram!
Com a convivência diária, porém, ela passa a conhecer melhor seu marido: ele era sim honesto e trabalhador, mas regado ao álcool, com frequência saía na farra com os amigos. Descobriu também que dormia com outras mulheres quase todas as noites.
Sua decepção foi muito grande. Ela tinha esperado tanto tempo por estes momentos, desejou tanto ser amada por um homem especial. Ele a agradava de tantas maneiras, a levava em passeios lindos e românticos, fazia juras de amor… Quando ela poderia ter imaginado viver em meio à tantas dificuldades e humilhações? Como ela poderia imaginar tamanha traição?
Mesmo assim, sofreu muda. Mulher forte que era, decidiu manter-se casada, pois acreditava que tinha sido uma escolha só sua, e não suportaria a vergonha diante dos familiares, que desde o início já reprovaram o sujeito..
Tinha o desejo de ser mãe, e engravidou duas vezes, mas perdeu o bebê nas duas tentativas. Com sua idade avançada e o marido relutante em ter mais filhos, encerraram as tentativas. Ele, afinal, já sustentava cinco filhos de outros relacionamento.
Década de 80. Aos seus 56 anos, Adair é aposentada, e se vê sem trabalho, sem afazeres, desnorteada sem um motivo de existir.
O marido de Adair passa a se relacionar com a faxineira da padaria que tinham em sociedade. Envolvidos há mais de um ano, engravidou a mulher, e manteve a concepção oculta escondendo-a numa chácara da família.
A faxineira deu à luz uma menina, e a trouxe do hospital somente depois de uma semana. Numa dessas noites, colocou sua filha à beira da cama para dormir, e a menina caiu. No pronto-socorro, os médicos diagnosticaram um leve achatamento no cérebro, ocasionando uma lesão que prejudicaria a coordenação motora de seu lado esquerdo. Além disso, a jovem garotinha sofreria de convulsões regulares por toda a vida, não fossem os remédios tomados constantemente. Como se não bastasse, sua mãe, deprimida, não ligava para a criança, não queria amamentar nem dava os mínimos cuidados ao bebê.
O pai, imaginando o destino trágico que sua filha poderia ter por tamanho descuido, volta para casa. Desesperado, com uma criança recém-nascida em seus braços, encontra sua esposa e confessa o seu drama, admite o seu erro, na longínqua esperança de que ela, sua companheira forte e equilibrada pudesse, de alguma forma, aceitar e criar essa criança. Sim, pedir à sua esposa que cuidasse deste bebê em suas mãos, fruto de seu relacionamento infiel e imoral. Dona Adair, que sonhou tanto em casar e ter filhos, sem esperanças de conceber, e com idade avançada, aceita este presente inusitado: uma filha.
Sim, ela aceitou criar a criança, fruto da traição de seu marido com outra mulher. A menina não tinha culpa das escolhas dos pais; foi adotada por amor, um amor difícil de entender. Diante desta situação, porém, Adair decidiu separar-se de seu marido.
Anos 90. Dona Daia, apelido carinhoso que Adair ganhara, passou anos indo e vindo de hospitais para manter o tratamento da criança. Os médicos não lhe davam esperanças: a menina Karina jamais andaria e dependeria de sua mãe por toda sua vida. Mesmo com o diagnóstico pessimista, ela nunca desanimou. Apesar de seus 70 anos, continuou levando-a a todos os exames e consultas necessários; quando Karina completou seus 14 anos, receberam a boa notícia: o achatamento no cérebro não existe mais, a criança está curada e não precisa mais tomar os medicamentos que a acompanharam desde então.
Mãe e filha estavam imensamente agradecidas a Deus. Esta filha tornou-se o sentido da vida dessa mãe.
Anos 2000. Um trágico acidente de trabalho ceifa a vida do pai da menina, e a tristeza invade o coração de ambas. Mesmo separados, o pai ainda mantinha uma forte convivência com a filha e a ex-esposa. A morte foi um golpe difícil da vida dessas mulheres. Dona Daia, com 74 anos, e Karina, com 17, decidem então buscar consolo nos braços de Deus e procuraram uma igreja. A jovem Karina, um ano depois, vem a conhecer a Deus e recebe a Jesus Cristo como seu Senhor e Salvador.
Anos 2010. Karina conclui seus estudos e se forma jornalista, para o orgulho de sua mãe! Sua filha, com tantas dificuldades, a despeito de tantos prognósticos pessimistas, superou as barreiras e venceu mais uma etapa!
Dona Daia, já com seus 88 anos, também quer receber a Cristo em seu coração. No dia de seu aniversário, questiona: “Será que Deus ainda aceita uma velha como eu?”. Com o coração sincero e grato, é batizada e aceita também a Cristo como seu Salvador.
15 de fevereiro de 2016. Dona Daia, aos 91 anos, deixa sua filha nesta terra, e um exemplo de dedicação, coragem e amor para todos nós. A peregrina finalmente encontrou um repouso seguro com seu Pai.
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Texto original “A História de um Milagre“: Karina Sant’Ana, adaptado por Pedro Angella
Edição e masterização: Chico Gabriel
Arte da vitrine: Chico Gabriel
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Duração: 00h20min48s
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